O (in)visível preconceito

23/07/2011 17:53

Por Walter Huspel 

 

Às vezes tem tanto assunto em uma semana que fica até difícil escolher um para comentar. No mínimo dois fatos reveladores do que (ainda) são o Brasil e os brasileiros.  O primeiro aconteceu no fim de semana na cidade de São João da Boa Vista, interior de São Paulo, onde pai e filho foram brutalmente agredidos por um grupo de jovens que achou que formavam um casal homossexual . O pai perdeu um pedaço da orelha. A outra notícia, que não mais nos choca pela naturalidade com que é dita, são as patroas reclamando que não se acha mais bons serviçais no Brasil.

Na verdade nenhuma delas choca mais.  Naturalizamos os crimes de ódio e a exploração. Podemos nos lamentar, alguns de nós, mas não nos indignamos . O fato é que, tal como as fazendas de cana do século 19, que tinham corredores entre as paredes para os escravos circularem na sede sem serem notados,  queremos estar cercados de seres invisíveis

Toleramos os gays, desde que não sejam gays em público. Devem manter as aparências cobradas pela família branca heterossexual. Toleramos a alcova, mas reprimimos violentamente em público. O indesejado incomoda a ponto de alguns jovens – vejam bem, jovens, aqueles que esperamos que sejam mais  liberais, menos preconceituosos – partirem para a barbárie contra dois homens que pensaram que eram um casal.  Ou pior, assassinarem 128 gays em 2011 por serem… gays

A reclamação sobre serviçais segue a mesma lógica. Queremos ter empregadas domésticas que passem despercebidas, que não tenham assunto para conversa, que não reclamem e que, obviamente, não ousem se colocar em pé de igualdade conosco, patrões bons e ilustrados. Ou seja, empregados domésticos devem ser serviçais, de cabeça baixa sempre, numa quase reverência, devem ser invisíveis, e, mais importante de tudo, não reclamar, nunca!

É isso que depreendemos do texto de hoje da conceituada Nina Horta, Chef de Cozinha , dona de Buffet e colunista da Folha de São Paulo. Nela Horta fala com saudades de uma antiga empregada sua que “lavava e passava com perfeição, e era uma inglesa, só conversava sobre tempo e flores”, e “nunca se queixou do trabalho extra” e que agora são “as novas ricas, que tomavam emprestado o status das patroas. Sabiam nomes de políticos, celebridades, peruas, esnobes sem causa”, para concluir com chave de ouro: “Por que se foram as boas empregadas dos bons patrões, é a pergunta”.

Por que? Eu me atrevo a tentar responder. Porque agora querem ter direitos, querem ter jornada de trabalho, porque agora ousam dizer não. Não querem ser “boas empregadas”, aquelas que só dizem docilmente  “sim”. Querem ser trabalhadores, como qualquer outro.

E os gays querem ser iguais, querem poder andar de mãos dadas com seu (sua) namorado(a), querem, inclusive, casar, coisa que ameaça não a tal família brasileira, mas o preconceito inculcado sobre a promiscuidade.  A proibição do casamento homossexual é a trincheira a ser defendida porque nos mostra que os gays são iguais a nós.

E tudo isso assusta. Assusta quem foi criado num ambiente segregado, que tem seus parâmetros fixos que colocam cada macaco no seu galho, previamente estabelecido, claro.

Aí, quando se rompem os galhos, há séculos estabelecidos, a revolta é geral, pois mostram o quão iguais os diferentes são. Mas isso, para muitos, é intolerável.

Fonte: Yahoo - Colunista

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