Obama Obama e Romney, visões opostas dos Estados Unidos

Miami, Estados Unidos, 6/11/2012 – A alternativa entre a reeleição de Barack Obama e a chegada à Casa Branca de Mitt Romney é mais do que uma diferença na contagem de votos: trata-se de uma visão contrastante do que os Estados Unidos foram, são e serão.

Obama é acusado de ser um tanto distante, reservado e muito profissional em sua campanha. Em contraste, Romney se apresenta como uma opção baseada na efetividade de seus negócios e na primazia que se deve dar à iniciativa privada, frente à desconfiança do governo desmesurado, caro e órfão de soluções.

Entretanto, não são essas as diferenças entre os dois candidatos nem tampouco a base da vitória de um ou outro. O contraste verdadeiro está em suas radicalmente diferentes concepções de Estados Unidos, a realidade que herdaram e que, de certa forma, contribuiu para gerar a partir de suas diferentes origens.

Obama é consciente de sua desvantagem histórica, catapultado à Casa Branca como exceção racial, alvo de notícia pura. Um cidadão que em outras latitudes seria qualificado como mulato de raiz incerta, sobrevivente de uma família esbofeteada pela dureza da vida, à força de ajuda e trabalho conquistou todos os degraus necessários para chegar ao Salão Oval.

Romney é o fiel retrato do triunfo do capitalismo mais ortodoxo, filho de governador, praticante de um ramo religioso que se orgulha de ser genuinamente norte-americano.

Destas duas raízes diferentes provém uma diferente concepção de Estados Unidos. Romney oferece o renascimento de um país que na realidade nunca existiu, idealizado por uma história manipulada, dourada por Hollywood, que milhões de norte-americanos adotaram como mito fundamental, irrenunciável, e que, paradoxalmente, lhes proporciona sua formidável segurança mental.

Esse Estados Unidos é a essência pura da nação de opção, forjada sobre a firme convicção de uma herança branca, iniciada por varões proprietários, crentes na viabilidade de um projeto impelido pela excepcionalidade e superioridade sobre os demais experimentos políticos e econômicos.

Mas essa nação, como ideia, mais do que como Estado, não se concretizou pela primazia do capital posto a funcionar sobre as pradarias abertas em busca do ouro californiano, mas pelo esforço de milhões de imigrantes, de todas as raças e cores, que chegaram a este território simplesmente em busca de uma segunda oportunidade (como a solicitada agora por Obama).

Outros o fizeram forçados, enlatados nos porões dos navios negreiros, destinados a uma existência sem esperança, da qual os resgatou Abraham Lincoln, ao preço da guerra mais cara da história do país. Enquanto a América da origem mitificada desapareceu, o país mestiço escorado por dezenas de heranças é o que se ergue para competir em um mundo que também mudou.

Se o mundo dominante durante a Guerra Fria garantia a sensação de relativa segurança e superioridade dos Estados Unidos, paradoxalmente o colapso da União Soviética deu lugar a um planeta semeado por maiores riscos e novas ameaças.

Os interesses por trás de Romney ainda acreditam que a decisão unilateral e a adoção de medidas de força garantem a sobrevivência do mito da superioridade no exterior que apoiaria o conforto interno. Obama, mais prudente e consciente das realidades do planeta,  sabe que os Estados Unidos potencialmente podem intervir em qualquer lugar do planeta, mas para ser eficaz necessita de alianças sólidas com seus sócios, e obtê-las não é fácil.

É significativo que a sociedade que pode majoritariamente votar em Obama (minorias, mulheres, assalariados e numerosos setores acomodados) hoje seja mais prudente e zelosa das aventuras do último presidente republicano e não deseja dar uma oportunidade ao seu candidato.

Pela frente há o outro lado que mesmo sendo derrotado não se dará por vencido e consolidará as posições de confronto para a mudança em dimensões socializantes e baseadas em maior proteção e vigilância do governo.

Se vencer, Obama sabe que somente foi votado por um terço do eleitorado potencial. Outro terço se mostrou indiferente e ficou em casa. O último terço que terá eleito Romney em grande parte o fez, como antes com John McCain, contra. Continuará negando o pão e o sal e criando obstáculos para os programas de progresso socialdemocrata que tentou em seu primeiro mandato.

As trincheiras abertas nesta eleição permanecerão abertas, com forças ferreamente inseridas em seus solos lamacentos. Se não se remediar (seja pelo esforço de Obama ou de Romney), o herdeiro da Casa Branca em 2016 receberá semelhante divórcio entre um país real e um virtual. Envolverde/IPS

Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Europeia da Universidade de Miami (jroy@Miami.edu). 

Fonte: IPS