Paraguai: Fernando Lugo destituído pelo Senado

23/06/2012 13:38

 

O presidente paraguaio foi alvo de uma destituição-relâmpago pelo Senado paraguaio, onde nunca dispôs de base política. Atacado por apoiar as ocupações dos sem-terra e conter a repressão, o ex-bispo católico diz que sai pela “maior porta do país, a porta do coração dos compatriotas” e apela a que as manifestações sejam pacíficas.
Fernando Lugo, enquanto esperava para ser ouvido no processo da sua destituição enquanto Presidente do Paraguai.
Fernando Lugo, enquanto esperava para ser ouvido no processo da sua destituição enquanto Presidente do Paraguai.


“Aos cidadãos, que não se neguem a seu direito de manifestar sua opinião, e conclamo que as manifestações sejam pacíficas. Que o sangue dos justos não se derrame nunca mais por causa de interesses mesquinhos em nosso país”, afirmou Fernando Lugo, depois de conhecer o previsível resultado do processo de destituição aberto na quinta-feira: apenas quatro senadores o apoiaram contra trinta e nove a defender a saída por mau desempenho no cargo. O vice-presidente Federico Franco assumiu  a Presidência do país, enquanto Lugo acusa os senadores de terem "distorcido" a lei.

A gota de água que levou à abertura do processo foram os confrontos do passado dia 15, durante o despejo de uma fazenda, que acabou com 17 mortos - onze camponeses sem-terra e seis polícias. Os senadores acusaram-no ainda de apoiar uma manifestação de jovens de esquerda no Comando de Engenharia das Forças Armadas em 2009, obrigar militares a obedecerem às ordens dos sem-terras, incompetência para travar a violência no país e os guerrilheiros do Exército do Povo Paraguaio, responsável pelo confronto da semana passada, e ainda por ter ratificado o Protocolo de Ushuaia 2, que prevê intervenção externa caso uma democracia esteja em perigo.

Fernando Lugo sempre foi criticado pela direita paraguaia por incentivar as ocupações pelos camponeses sem-terra. Mas governava com ministros do Partido Liberal e até do Partido Colorado, que controlou o Governo por mais de seis décadas, o que ajuda a explicar que ao discurso igualitário não tenham correspondido reformas com o mesmo alcance desde que chegou à Presidência em 2008.

"Os exportadores de soja no Paraguai só pagam 3% de impostos, enquanto na Argentina pagam 30%", afirma ao El Pais o economista paraguaio Óscar Rodriguez.  "Não pôde fazer grande coisa pela reforma agrária, mas conseguiu implantar um sistema de saúde que permitiu à maior parte da população obter medicina de forma gratuita. Também concedeu subsídios para mais de 20 mil famílias que viviam em extrema pobreza e levou o pequeno-almoço e o almoço gratuito às escolas públicas", acrescenta o professor da Universidade de Assunção.

A proximidade das eleições presidenciais, previstas para o próximo ano, é outra leitura da situação na imprensa internacional, indicando a satisfação dos candidatos da direita com a perspetiva de não encontrarem Lugo a fazer campanha no lugar de Presidente.    

As reações internacionais surgiram durante o processo de destituião, com uma missão de chanceleres da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) a visitar Assunção para ouvir o Presidente e o seu Vice. No fim, reafirmaram  "total solidariedade ao povo paraguaio e apoio ao presidente Fernando Lugo”. A Organização de Estados Americanos (OEA) reuniu em Washington para pedir "respeito ao devido processo" no julgamento da destituiçãode Lugo. Segundo a agência pública de notícias IP Paraguay, na reunião, os representantes da Venezuela, Nicarágua e Bolívia classificaram o processo de "golpe velado".