Paraguai: Fernando Lugo destituído pelo Senado

“Aos cidadãos, que não se neguem a seu direito de manifestar sua opinião, e conclamo que as manifestações sejam pacíficas. Que o sangue dos justos não se derrame nunca mais por causa de interesses mesquinhos em nosso país”, afirmou Fernando Lugo, depois de conhecer o previsível resultado do processo de destituição aberto na quinta-feira: apenas quatro senadores o apoiaram contra trinta e nove a defender a saída por mau desempenho no cargo. O vice-presidente Federico Franco assumiu a Presidência do país, enquanto Lugo acusa os senadores de terem "distorcido" a lei.
A gota de água que levou à abertura do processo foram os confrontos do passado dia 15, durante o despejo de uma fazenda, que acabou com 17 mortos - onze camponeses sem-terra e seis polícias. Os senadores acusaram-no ainda de apoiar uma manifestação de jovens de esquerda no Comando de Engenharia das Forças Armadas em 2009, obrigar militares a obedecerem às ordens dos sem-terras, incompetência para travar a violência no país e os guerrilheiros do Exército do Povo Paraguaio, responsável pelo confronto da semana passada, e ainda por ter ratificado o Protocolo de Ushuaia 2, que prevê intervenção externa caso uma democracia esteja em perigo.
Fernando Lugo sempre foi criticado pela direita paraguaia por incentivar as ocupações pelos camponeses sem-terra. Mas governava com ministros do Partido Liberal e até do Partido Colorado, que controlou o Governo por mais de seis décadas, o que ajuda a explicar que ao discurso igualitário não tenham correspondido reformas com o mesmo alcance desde que chegou à Presidência em 2008.
"Os exportadores de soja no Paraguai só pagam 3% de impostos, enquanto na Argentina pagam 30%", afirma ao El Pais o economista paraguaio Óscar Rodriguez. "Não pôde fazer grande coisa pela reforma agrária, mas conseguiu implantar um sistema de saúde que permitiu à maior parte da população obter medicina de forma gratuita. Também concedeu subsídios para mais de 20 mil famílias que viviam em extrema pobreza e levou o pequeno-almoço e o almoço gratuito às escolas públicas", acrescenta o professor da Universidade de Assunção.
A proximidade das eleições presidenciais, previstas para o próximo ano, é outra leitura da situação na imprensa internacional, indicando a satisfação dos candidatos da direita com a perspetiva de não encontrarem Lugo a fazer campanha no lugar de Presidente.
As reações internacionais surgiram durante o processo de destituião, com uma missão de chanceleres da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) a visitar Assunção para ouvir o Presidente e o seu Vice. No fim, reafirmaram "total solidariedade ao povo paraguaio e apoio ao presidente Fernando Lugo”. A Organização de Estados Americanos (OEA) reuniu em Washington para pedir "respeito ao devido processo" no julgamento da destituiçãode Lugo. Segundo a agência pública de notícias IP Paraguay, na reunião, os representantes da Venezuela, Nicarágua e Bolívia classificaram o processo de "golpe velado".