União gay: tem juiz e deputado precisando de carinho

21/06/2011 08:41

Detesto fazer cobranças de apostas em público – até porque o jogo é (oficialmente) ilegal no Brasil – mas gostaria de pedir para separarem meu engradado de suco de manga. Eu havia dito que algum espertinho no Congresso Nacional, de alguma bancada ligada à religião, ia contestar, em menos de um mês, a decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu a união estável homoafetiva no último dia 5. Aqui se faz, aqui se paga. João Campos (PSDG-GO) vai tentar no Parlamento derrubar a decisão dos ministros. Seu pedido foi apresentado em nome da Frente Parlamentar Evangélica.

Não me orgulho em ganhar as garrafinhas, pelo contrário. Preferiria pagá-las mil vezes a ter que ler notícias desse naipe. E eu já tinha dobrado a dose de Omeprazol desde que, na última sexta, o juiz Jerônymo Pedro Villas Boas anulou uma união estável celebrado entre dois homens e proibiu esse registro em qualquer cartório de Goiânia. O STF terá que, agora, se reunir de novo para fazer valer o entendimento na capital de Goiás e passar um pito no espertinho.

A preguiça que tenho desse pessoal é de um tamanho que vocês não imaginam. Isso sem contar a ação abnegada desses auto-intitulados representantes das forças do universo aqui na Terra para travar a legislação que tornaria crime a homofobia. Querem ter o direito de continuar dizendo que “ser viado é coisa do diabo e, por isso, precisa ser extirpado a todo o custo”, como bem disse um ex-comentarista deste blog tempos atrás.

Ah, mas você é cientista político e não defende a separação de poderes e não critica quando a Justiça usurpa a função que deveria ser dos eleitos democraticamente para isso? Sim e não. O país tem uma Constituição que garante direitos iguais para todos, mas no vácuo da inação do Parlamento de efetivar esses direitos, eis que surge a Suprema Corte, instada a partir de casos reais sobre dúvidas reais que não podem esperar.

Um casal gay não pode ficar no limbo só porque alguém acredita que uma força sobrenatural não gosta de duas pessoas que se amem independentemente se têm pinto ou vagina. Tenho certeza que Deus – se existe – deve tomar Frontal nessas horas para aguentar esses argumentos. De certa forma, ele está acostumamo, pois é uma forma de inquisição. Com os evangélicos tendo aprendido bem o modus operandi católico.

“E o meu direito à liberdade de expressão, de poder reclamar dos gays? Você não defende essa liberdade para os maconheiros que marcham?” Desculpe, mas se você está usando esse argumento, peço encarecidamente que procure outro blog. Vai. Mas vai mesmo e não olha para trás, ok? Não pela sua opinião, que por mais bizarra que seja é sempre bem-vinda, mas pela incapacidade de entender o que estamos discutindo aqui há anos. Que por nascerem seres humanos todos compartilham do direito à dignidade, que deve ser garantida a todo o custo e acima de qualquer outra coisa. Garantida por um Estado que, lembremos, deve ser laico, possibilitando a liberdade de culto, mas protegendo as minorias do absolutismo bisonho de formas de inquisição contemporânea.

Tanto o nobre magistrado quanto o excelentíssimo deputado não lograrão êxito em suas buscas pelas trevas, pela desigualdade e a intolerância. Mas vale lembrar que eles não são casos únicos, mas representam uma parcela da sociedade que ficou com sangue nos olhos com a decisão do STF. Não digeriram ainda o que aconteceu e devem vomitar por um bom tempo tentativas de voltar atrás, alimentando nosso querido Febeapá.

Enquanto isso, o que fazemos? Simples, tratar esse povo como a mesma complacência com a qual se trata uma criança que não entendeu ainda que não pode machucar o amiguinho só porque ele é diferente. Educando, com amor e carinho, pois um dia eles vão entender.

Fonte: Blog do Sakamoto