Planejamento agrícola para salvar as árvores
11/04/2012 19:43

O principio é sedutoramente simples: para reduzir as emissões de carbono, basta deixar as florestas tropicais de pé. Porém, uma abordagem amplamente divulgada, nas quais os países ricos pagariam os mais pobres para manter suas florestas intactas, se mostrou mais difícil de executar do que muitos haviam esperado. Agora, um consórcio de cientistas, ambientalistas e indústrias está expandindo o foco de preservar florestas para enfrentar os maiores causadores do desmatamento: a agricultura.
A iniciativa florestal das Nações Unidas – conhecida como REDD, para Reduzir Emissões causadas pelo Desmatamento e pela Degradação Florestal – foi originalmente vista como uma maneira de alterar fronteiras econômicas por meio de conectar o valor monetário a florestas de pé, que envolvem o dióxido de carbono e estabilizar o clima. Pagamentos de carbono facilitariam aos proprietários de terra o sustento sem precisar desmatar mais terras. Porém, apesar dos anos de negociação e dos bilhões de dólares em compromissos, pouco dinheiro tem sido encaminhado para aqueles que vivem e trabalham na fronteira florestal. O dinheiro tem sido movimentado principalmente no âmbito do governo, diz Daniel Nepstad, um ecologista americano que presidia os programas internacionais para o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), sediado em Brasília. Como resultado, ele afirma, o ceticismo está crescendo entre aqueles que deveriam ser os maiores beneficiados.
Nepstad e outros envolvidos no mais recente esforço REDD, enxergam potencial para um progresso mais eficiente ao unir iniciativas REDD com uma série de “debates sobre commodities”, os quais unem empresas multinacionais - como a produtora de bebidas PepsiCo, a gigante da biotecnia agrícola Monsanto e a varejista Walmart - a produtores e ambientalistas para que, juntos, possam negociar padrões de certificação ambiental para produtos como sementes de soja, óleo de palma, cana-de-açúcar e carne. Esses padrões discutiriam desde o manejo do solo até os direitos dos trabalhadores, e incluiriam limites para o desmatamento. A ideia é que produtores que se juntam ao movimento e implementam as melhores práticas poderão aumentar a produtividade, comandar um preço mais alto para os seus produtos e pressionar os competidores para que elevem os seus próprios padrões. “A REDD se tornou negativamente carregada”, disse Nepstad. “Ao mesmo tempo em que está caminhando pra frente de modo mais eficiente, está caminhando junto a estratégias de desenvolvimento rural”.
O IPAM lidera um consórcio altamente difuso conhecido como Mesa redonda REDD, o qual publicou uma análise em 28 de março que identifica países nos quais o investimento em projetos para a produção de cana-de-açúcar, soja e óleo de palma poderiam ter maiores impactos no carbono (ver 'Food versus forests'). Com mais de US$ 4 milhões em investimentos vindos da Noruega, o consórcio planeja anunciar uma rodada inicial de projetos à época da Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável, que será realizada no Rio de Janeiro (Rio+20), Brasil, em junho.
.jpg)
Inicialmente, os projetos do consórcio poderiam se concentrar em recuperar terras agrícolas abandonadas e intensificar a produção em fazendas e plantações já existentes. Isso poderia envolver a replantação acelerada de palmas com variedades de alto-rendimento na Indonésia, ou ajudar agricultores e fazendeiros para ter acesso ao dinheiro existente para agricultura sustentável no Brasil. Em relação ao último caso, Nepstad afirma que o consórcio está analisando formas de ajudar aqueles proprietários que se comprometem aos padrões da mesa-redonda para subsidiar empréstimos do governo – valorizados em torno de $1.7 bilhões durante a atual temporada de crescimento – para que eles possam melhorar o solo e intensificar suas produções ou recuperar campos degradados ao invés de desmatar novos. O consórcio também está analisando enfrentar emissões de gases de efeito estufa usando créditos de carbono, os quais poderiam ser vendidos a investidores privados ou empresas que procuram diminuir suas próprias emissões. Esses fundos poderiam ajudar agricultores e fazendeiros a desenvolver melhores práticas de gerenciamento do solo e usar fertilizantes de forma mais eficiente ou capturar emissões de metano para geração elétrica.
Fator de mudança
O potencial do programa é destacado pelo recente progresso no Brasil, onde o desmatamento na Amazônia caiu em 78% desde o seu auge, atingido em 2004, enquanto a produção agrícola continuava a crescer. Estudos recentes sugerem que a fiscalização do governo e políticas agrícolas mais abrangentes desempenharam um papel nesse declínio, porém consumidores e ambientalistas também contribuíram ao pressionar grandes fornecedores de alimentos a assinar uma moratória em relação a compra de soja e carne vindas de terras recentemente desmatadas. O modelo de mesa-redonda, o qual já está operando para algumas commodities, é semelhante. Embora seja muito cedo para enxergar mudanças no uso da terra em dados de satélite, as mesas-redondas de fato parecem estar afetando a maneira como muitas empresas conduzem seus negócios, afirma Holly Gibbs, geógrafa ambiental da Universidade de Wisconsin-Madison. “Eu não sei se é uma mudança efetiva ainda,” declara Gibbs, “porém, eles definitivamente estão mudando as regras, as normas e a maneira de operar.”
No entanto, até seus defensores reconhecem que é difícil alcançar um consenso em relação a padrões ambientais em uma sala cheia de produtores, grandes empresas de alimentos e ambientalistas, todos com objetivos conflitantes. Isso tem levado a algumas criticas de que mesas-redondas fornecem cobertura política para empresas que desejam evitar se comprometer mais profundamente com o meio-ambiente.
“Discordo de que mesas-redondas estão freando a inovação”, diz Scott Poynton, diretor executivo do Fundo Floresta, uma organização não governamental em Crassier, Suiça, a qual tem trabalhado com a empresa de alimentos suíça Nestlé e com a segunda maior produtora mundial de óleo de palma, a Golden Agri-Resources na Indonésia, para reforçar seus compromissos de desmatamento zero. Empresas que querem parar com o desmatamento deveriam pressionar seus fornecedores diretamente, declara Poynton. “O modelo está ali,” afirma, “e não exige os bilhões de dólares que todo mundo está falando”.
Ao invés disso, as mesas-redondas tem o propósito de ajudar a propagar os mínimos padrões ambientais ao redor do mundo. “Leva tempo até que todas essas empresas alinhem os seus princípios”, declara Jeroen Douglas, diretor sul-americano do programa para a rede Solidaridad em Buenos Aires, o qual se concentra em cadeias de fornecimento sustentáveis. A Solidaridad planeja investir em torno de 70 milhões de euros (US$ 94 milhões) para ajudar 400.000 pequenos agricultores e fazendeiros para atingir seus certificados para a mesa-redonda até 2015. Porém, existem barreiras, e Douglas declara que a conexão com dinheiro da REDD pode ser o suficiente para seduzir produtores locais.
Outros esforços estão emergindo. Por exemplo, a coalisão entre governos estaduais nos Estados Unidos, Brasil, Indonésia, Nigéria, Peru e México lançou sua própria iniciativa, a Força Tarefa dos Governadores para Clima e Florestas, que está trabalhando para criar mecanismos que permitiriam às empresas em regiões participantes reduzir as emissões ao pagar para reduzir o desmatamento.
William Boyd, professor de direito na Universidade do Colorado, em Boulder, e líder do projeto para a força-tarefa, afirma que tanto a mesa-redonda e os esforços dos estados são emblemáticos das necessidades. Se o dinheiro para transformar agricultura e reduzir os incentivos para desmatar florestas não começar a aparecer em breve, agricultores nos países em desenvolvimento desistirão do processo, afirma Boyd, “e quem poderá culpá-los?”.
Publicado originalmente em Nature
Diante da dificuldade de colocar em prática o REDD, cientistas, ambientalistas e indústrias estão expandindo o foco da preservação para levar em conta questões como o manejo da terra e o direito dos trabalhadores rurais

O principio é sedutoramente simples: para reduzir as emissões de carbono, basta deixar as florestas tropicais de pé. Porém, uma abordagem amplamente divulgada, nas quais os países ricos pagariam os mais pobres para manter suas florestas intactas, se mostrou mais difícil de executar do que muitos haviam esperado. Agora, um consórcio de cientistas, ambientalistas e indústrias está expandindo o foco de preservar florestas para enfrentar os maiores causadores do desmatamento: a agricultura.
A iniciativa florestal das Nações Unidas – conhecida como REDD, para Reduzir Emissões causadas pelo Desmatamento e pela Degradação Florestal – foi originalmente vista como uma maneira de alterar fronteiras econômicas por meio de conectar o valor monetário a florestas de pé, que envolvem o dióxido de carbono e estabilizar o clima. Pagamentos de carbono facilitariam aos proprietários de terra o sustento sem precisar desmatar mais terras. Porém, apesar dos anos de negociação e dos bilhões de dólares em compromissos, pouco dinheiro tem sido encaminhado para aqueles que vivem e trabalham na fronteira florestal. O dinheiro tem sido movimentado principalmente no âmbito do governo, diz Daniel Nepstad, um ecologista americano que presidia os programas internacionais para o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), sediado em Brasília. Como resultado, ele afirma, o ceticismo está crescendo entre aqueles que deveriam ser os maiores beneficiados.
Nepstad e outros envolvidos no mais recente esforço REDD, enxergam potencial para um progresso mais eficiente ao unir iniciativas REDD com uma série de “debates sobre commodities”, os quais unem empresas multinacionais - como a produtora de bebidas PepsiCo, a gigante da biotecnia agrícola Monsanto e a varejista Walmart - a produtores e ambientalistas para que, juntos, possam negociar padrões de certificação ambiental para produtos como sementes de soja, óleo de palma, cana-de-açúcar e carne. Esses padrões discutiriam desde o manejo do solo até os direitos dos trabalhadores, e incluiriam limites para o desmatamento. A ideia é que produtores que se juntam ao movimento e implementam as melhores práticas poderão aumentar a produtividade, comandar um preço mais alto para os seus produtos e pressionar os competidores para que elevem os seus próprios padrões. “A REDD se tornou negativamente carregada”, disse Nepstad. “Ao mesmo tempo em que está caminhando pra frente de modo mais eficiente, está caminhando junto a estratégias de desenvolvimento rural”.
O IPAM lidera um consórcio altamente difuso conhecido como Mesa redonda REDD, o qual publicou uma análise em 28 de março que identifica países nos quais o investimento em projetos para a produção de cana-de-açúcar, soja e óleo de palma poderiam ter maiores impactos no carbono (ver 'Food versus forests'). Com mais de US$ 4 milhões em investimentos vindos da Noruega, o consórcio planeja anunciar uma rodada inicial de projetos à época da Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável, que será realizada no Rio de Janeiro (Rio+20), Brasil, em junho.
.jpg)
Inicialmente, os projetos do consórcio poderiam se concentrar em recuperar terras agrícolas abandonadas e intensificar a produção em fazendas e plantações já existentes. Isso poderia envolver a replantação acelerada de palmas com variedades de alto-rendimento na Indonésia, ou ajudar agricultores e fazendeiros para ter acesso ao dinheiro existente para agricultura sustentável no Brasil. Em relação ao último caso, Nepstad afirma que o consórcio está analisando formas de ajudar aqueles proprietários que se comprometem aos padrões da mesa-redonda para subsidiar empréstimos do governo – valorizados em torno de $1.7 bilhões durante a atual temporada de crescimento – para que eles possam melhorar o solo e intensificar suas produções ou recuperar campos degradados ao invés de desmatar novos. O consórcio também está analisando enfrentar emissões de gases de efeito estufa usando créditos de carbono, os quais poderiam ser vendidos a investidores privados ou empresas que procuram diminuir suas próprias emissões. Esses fundos poderiam ajudar agricultores e fazendeiros a desenvolver melhores práticas de gerenciamento do solo e usar fertilizantes de forma mais eficiente ou capturar emissões de metano para geração elétrica.
Fator de mudança
O potencial do programa é destacado pelo recente progresso no Brasil, onde o desmatamento na Amazônia caiu em 78% desde o seu auge, atingido em 2004, enquanto a produção agrícola continuava a crescer. Estudos recentes sugerem que a fiscalização do governo e políticas agrícolas mais abrangentes desempenharam um papel nesse declínio, porém consumidores e ambientalistas também contribuíram ao pressionar grandes fornecedores de alimentos a assinar uma moratória em relação a compra de soja e carne vindas de terras recentemente desmatadas. O modelo de mesa-redonda, o qual já está operando para algumas commodities, é semelhante. Embora seja muito cedo para enxergar mudanças no uso da terra em dados de satélite, as mesas-redondas de fato parecem estar afetando a maneira como muitas empresas conduzem seus negócios, afirma Holly Gibbs, geógrafa ambiental da Universidade de Wisconsin-Madison. “Eu não sei se é uma mudança efetiva ainda,” declara Gibbs, “porém, eles definitivamente estão mudando as regras, as normas e a maneira de operar.”
No entanto, até seus defensores reconhecem que é difícil alcançar um consenso em relação a padrões ambientais em uma sala cheia de produtores, grandes empresas de alimentos e ambientalistas, todos com objetivos conflitantes. Isso tem levado a algumas criticas de que mesas-redondas fornecem cobertura política para empresas que desejam evitar se comprometer mais profundamente com o meio-ambiente.
“Discordo de que mesas-redondas estão freando a inovação”, diz Scott Poynton, diretor executivo do Fundo Floresta, uma organização não governamental em Crassier, Suiça, a qual tem trabalhado com a empresa de alimentos suíça Nestlé e com a segunda maior produtora mundial de óleo de palma, a Golden Agri-Resources na Indonésia, para reforçar seus compromissos de desmatamento zero. Empresas que querem parar com o desmatamento deveriam pressionar seus fornecedores diretamente, declara Poynton. “O modelo está ali,” afirma, “e não exige os bilhões de dólares que todo mundo está falando”.
Ao invés disso, as mesas-redondas tem o propósito de ajudar a propagar os mínimos padrões ambientais ao redor do mundo. “Leva tempo até que todas essas empresas alinhem os seus princípios”, declara Jeroen Douglas, diretor sul-americano do programa para a rede Solidaridad em Buenos Aires, o qual se concentra em cadeias de fornecimento sustentáveis. A Solidaridad planeja investir em torno de 70 milhões de euros (US$ 94 milhões) para ajudar 400.000 pequenos agricultores e fazendeiros para atingir seus certificados para a mesa-redonda até 2015. Porém, existem barreiras, e Douglas declara que a conexão com dinheiro da REDD pode ser o suficiente para seduzir produtores locais.
Outros esforços estão emergindo. Por exemplo, a coalisão entre governos estaduais nos Estados Unidos, Brasil, Indonésia, Nigéria, Peru e México lançou sua própria iniciativa, a Força Tarefa dos Governadores para Clima e Florestas, que está trabalhando para criar mecanismos que permitiriam às empresas em regiões participantes reduzir as emissões ao pagar para reduzir o desmatamento.
William Boyd, professor de direito na Universidade do Colorado, em Boulder, e líder do projeto para a força-tarefa, afirma que tanto a mesa-redonda e os esforços dos estados são emblemáticos das necessidades. Se o dinheiro para transformar agricultura e reduzir os incentivos para desmatar florestas não começar a aparecer em breve, agricultores nos países em desenvolvimento desistirão do processo, afirma Boyd, “e quem poderá culpá-los?”.
Publicado originalmente em Nature
Autor: Jeff Tollefson - Fonte: Nature/IPAM
Tópico: Planejamento agrícola para salvar as árvores
Nenhum comentário foi encontrado.